História da educação aos meios de comunicação na Europa

Na maior parte dos países europeus a educação aos meios de comunicação faz parte da vida escolar, integrando o currículo como atividade extra. A Declaração de Grunwald, da Unesco, no início dos anos 1980, e a Declaração de Sevilha, em 2002, definem historicamente a educação aos meios de comunicação como meio para promover a participação democráticas dos cidadãos. No congresso internacional “Media education in Europe”, realizado em Belfast em 2004 como parte do projeto Media-Educ,  da Comissão Europeia, representantes de 23 países se reuniram e chegaram à conclusão que existia uma necessidade imediata de qualificar profissionais que atuassem nas escolas como educomunicadores. A partir de 2006 o projeto passou a ser chamar EuroMediaLiteracy e oferece suporte aos programas de alfabetização e educação aos meios de comunicação em toda a Europa.

Paulatinamente cada país foi desenvolvendo estratégias para agregar esse saber ao sistema escolar. A França criou a Semaine de la presse, a Espanha se dedicou com muita atenção ao uso dos videogames, na Alemanha os programas de educação fundamental e de escola média agregaram os princípios da educação aos meios e foram criados centros de mídia nas bibliotecas. Algumas universidades criaram a disciplina “Media education”  e quase todas as faculdades de Pedagogia e Ciências da Educação têm projetos de pesquisa nessa área. 

A pesquisa acadêmica realizada pela sueca Cecilia von Feilitzen demonstrou que nos países desenvolvidos, como Estados Unidos, Austrália e os países europeus, a educação aos meios de comunicação aparece como instrumento para ajudar os indivíduos a serem mais críticos, independentes e participantes, enquanto na África, Ásia e America Latina procuram explicar o papel das mídias na liberação e no desenvolvimento de toda a comunidade, sugerindo que a democratização deve incluir a solução dos problemas sociais, como a justiça social para os oprimidos.

Até o fim dos anos 1970, as pesquisas na área tinham um caráter defensivo, limitada a defender as crianças dos efeitos negativos dos meios de comunicação. Atualmente estamos diante de uma estratégia de “ataque”, com a intenção de fornecer às crianças competências midiáticas (Medienkompetenz) e poder para que adquiram a capacidade de compreender e se confrontar com o universo dos meios de comunicação e de saber criar novas formas de expressão e de comunicação. A educação aos meios de comunicação assume também uma conotação social e política: é direcionada ao cidadão para que ele não seja apenas um usuário sem crítica das mídias, mas que seja um cidadão responsável pela disseminação da informação.

A maioria das experiências em educação aos meios de comunicação nasce no problema do usos da tecnologia para desenvolver as capacidades dos indivíduos para se integrar na sociedade onde vive sem esquecer a si mesmo. A política tecnológica deve dialogar com uma visão de ecologia midiática, fato que se refere também a uma visão global da personalidade e ao seu desenvolvimento. O problema de uma ecologia midiática  na escola se apresenta pelo menos sob dois aspectos, um mais quantitativo, outro mais qualitativo ou, como denomina o italiano Antonio Calvani, “ergonômico-cognitivo”. 

A pergunta que devemos fazer é em que medida devemos recorrer às novas tecnologias, a tecnologias mais tradicionais, como livro e vídeo, e em que medida recorrer a aprendizados baseados nas questões manuais e corporais? De acordo com Calvani, o uso do computador pode ser também proposto, por exemplo, como instrumento para uma primeira familiarização à leitura e à escritura, como instrumento expressivo, comunicativo-operativo ou mesmo puramente lúdico desde que não venha a atrapalhar outros espaços. O aspecto ergonômico-cognitivo é mais complexo e também mais fascinante para as reflexões atuais no plano histórico e cultural, em especial no caso da história da escrita.

O problema é que o uso de uma tecnologia cognitiva (pensemos, por exemplo, nas calculadoras ou na escritura eletrônica) tem normalmente um efeito de enfraquecimento da mente que transfere para o ambiente externo a função interna; o fato de que a escritura enfraquece a memória é um dado que Platão já tinha observado, da mesma forma pela qual hoje é evidente para todos como as máquinas calculadoras desativam o cálculo mnemônico. Desse ponto de vista as tecnologias contribuiriam para enfraquecer as funções cognitivas em vez de desenvolvê-las. Na realidade, ao lado desse aspecto de “degradação cognitiva” na integração mente-meio podem aparecer também novas potencialidades. 

Enquanto isso a integração entre indivíduo e tecnologia normalmente dá lugar a algo mais eficiente que apenas a atividade cognitiva (nos casos específicos a escrita conserva melhor os dados e as máquinas permitem enfrentar cálculos mais complexos). Mas, além disso, a prática tecnológica pode abrir espaço para formas cognitivas de tipos diferentes, como o desenvolvimento da escritura, ação que torna mais visível a linguagem e permite estimular o pensamento. A leitura e a escritura, como verificamos nos capítulo anterior, têm um papel relevante na história da cultura ocidental, e com a transmissão eletrônica terão um novo perfil.

A transmissão eletrônica dos textos e a nova forma de ler que elas impõem determinam a terceira revolução da leitura que aconteceu a partir da Idade Média. Ler em uma tela não é como ler um livro. Essa nova representação transforma a noção de contexto, substituindo a contiguidade física entre os textos presentes em um único objeto, seja ele um livro, uma revista ou um jornal, a sua posição e a distribuição dentro de arquitetura lógicas – aquelas que governam as bases de dados, as planilhas eletrônicas, os repertórios pessoais e as palavras-chave que tornam possível o acesso à informação. Ela redefine, de tal forma, a “materialidade” dos trabalhos, quebrando a ligação física que existia entre o objeto impressos e o texto, dando mais poder ao leitor.

Nessa nova integração entre mente e meio se abrem novas estradas e formas mais relevantes de pensamento. É preciso, no entanto, intervir intencionalmente para selecionar tecnologias idôneas para favorecer formas criativas ou para preencher conscientemente os novos espaços com outras atribuições cognitivas. Nesse ponto o papel do professor se torna essencial. Umberto Eco mostra que o saber no caso dos meios e no uso da informação não depende somente da escola. Enquanto no passado a preocupação da escola era “dar” o desconhecido”, hoje o problema se torna aquele de “filtrar” o conhecido, o que foi adquirido precedentemente, sem um guia.

De acordo com Len Masterman, o saber não é algo que os professores possuem e podem transmitir aos estudantes. Ideias e informações espalhadas pelo mundo devem ser  elaboradas para a construção de uma cidadania ativa em um contexto em que exista a necessidade de promover um diálogo intercultural. A natureza dos textos nos meios de comunicação mostra que a forma na qual a realidade é representada reforça as ideologias dos grupos dominantes na sociedade.

No desenvolvimento da educação aos meios de comunicação na Europa vemos que a intertextualidade é hoje a característica dominante e que a interatividade é avaliada positivamente. O estudo das linguagens dos meios de comunicação se divide em significados, convenções, códigos, gêneros, escolhas, combinações e tecnologias usadas na representação da realidade. Depois da primeira aproximação linguística, vemos que o realismo, a verdade, a inclusão ou a exclusão, a objetividade, a interpretação ou a influência são os elementos que devem ser avaliados no processo de aproximação à leitura dos meios de comunicação. Portanto se propõe um percurso com a finalidade de determinar o comportamento da audiência.

As estratégias de pedagogia dos meios de comunicação, usadas na maioria dos países da Europa, estão sempre centradas no estudante, com incentivo à troca de conhecimentos e competências entre os colegas de classe. Na prática em sala de aula se realiza a análise do texto, tirando do contexto, descrevendo, considerando os seus significados e realizando análises críticas. Em um segundo momento o texto deve ser estudado dentro do contexto no qual se insere. São realizados estudos de casos e traduções intersemióticas, ou seja, de um meio de comunicação para outro, como da televisão para a imprensa e vice-versa. Em seguida são realizadas simulações de produção de produtos com uma proposta pedagógica de expressão de si mesmo criativamente ou artisticamente. 

Na Europa e em alguns países da América Latina os estudos dos meios de comunicação e a educação para os meios começam a ser estudados como um sujeito acadêmico em âmbito separado. No Reino Unido desde os anos 1960 apareceram os primeiros cursos de Midia Education e o British Film Institute (BFI), além de ser um banco de dados de filmes e publicação de livros e revistas, se ocupa também da educação aos meios de comunicação através da imagem, oferecendo cursos de formação para os professores e colocando à disposição um grande arquivo de projetos, programas, cursos, seminários, etc, sobre media literacy

Alguns dos itens trabalhados pelo BFI nos currículos escolares são:

  1. Em História: como eventos e períodos históricos podem ser representados em gêneros diferentes de textos de mídia, ambos factual ou ficcional; como os textos dos meios de comunicação podem ser usados como evidências em estudos históricos, e como os seus valores e limitações são acessados; como diferentes recursos e tipos de evidência podem ser combinados e manipulados nas representações do passado nos meios de comunicação; como figuras históricas usaram os meios de comunicação para exercer influência ou ganhar poder; o impacto histórico de mudanças e desenvolvimentos nos meios de comunicação.
  2. Em Ciências: as técnicas usadas pelos produtores dos meios de comunicação para representar processos científicos e o mundo natural; como cientistas e progressos científicos são representados na cultura popular; como conhecimento científico é tratado nos debates midiáticos sobre temas controversos, e como diferentes interpretações são apresentadas; como a credibilidade científica aparece na publicidade; o processo científico envolve formas específicas de tecnologia dos meios de comunicação, como vídeo ou projeção de filmes.
  3. Em Língua Estrangeira: como os meios de comunicação tratam a linguagem verbal no noticiário e na publicidade; comparação entre os estilos e as instituições dos meios de comunicação em outros países e o país de origem; diferenças de linguagem no noticiário internacional ou esporte, por exemplo; a representação da identidade nacional nos vários meios de comunicação, inclusive cartões postais e mapas turísticos; as diferentes formas em que o mesmo texto são apresentados em países diversos.
  4. Em Música: como editar é um trabalho coordenado com música incidental e ruídos em filmes e na televisão; como formas genéricas de música são usadas para criar atmosfera e  resposta emocional entre as audiências; como diferentes tipos de música são coletadas e vendidas para públicos diferentes; como a indústria da música se relaciona com outras indústrias midiáticas; o uso da imagem virtual em material publicitário. 

Apesar do aparente papel instrumental desse esquema, ele é a base para desenvolver aspectos cognitivos que permite navegar no prazer da descoberta da informação. O projeto holandês “Mira Media”,  fundado em 1986 e voltado para minorias étnicas, visa integrar adultos imigrantes através dos recursos da educação aos meios de comunicação, oferecendo um canal de expressão a um grupo social que se encontra em dificuldade. Os programas criados no projeto são transmitidos pelas cadeias de rádio e televisão regionais ou nacionais, tanto públicos quanto comerciais. A produção dos conteúdos é realizada com a ajuda de organizações de apoio aos imigrantes na Holanda, promovendo a diversidade e a pluralidade entre os cidadãos.

O desenvolvimento das competências nos meios de comunicação dos leitores, telespectadores e ouvintes no projeto “Mira Media” ganhou repercussão na Comunidade Europeia e, por conta disso, foram criados programas supranacionais como o “On line/ More colour in the Media”, parte de uma rede chamada “The Multicultural Skyscraper”, que tem um papel de banco de dados no setor dos meios de comunicação para as minorias étnicas na Europa. Entre os projetos que podem ser incluídos nessa comunidade existe, na Itália, o “SecondaGenerazione.it”, elaborado para os filhos dos imigrantes nascidos na Itália. O primeiro vídeo preparado pelos participantes de desse projeto teve como tema a defesa dos direitos desses cidadãos.

Um outro exemplo de política em educação para os meios de comunicação na Europa é o CLEMI (Centre de liaison de l’enseignement et des moyens d’information), na França, responsável pelo projeto “Semaine de la Presse”. Desde 1983 o CLEMI trabalha em conjunto com o Centre national de documentation pédagogique (CNDP) e tem o objetivo de promover, de forma especial através de ações de formação, o uso plural dos meios de informação no ensino, com a finalidade de oferecer uma melhor compreensão por parte dos alunos sobre o mundo que os rodeia, desenvolvendo ao mesmo tempo o seu senso crítico. Professores e profissionais de comunicação trabalham juntos para organizar cursos de formação, operações específicas, de trocas ou de convênios, além disso são realizados encontros com os responsáveis pelos meios de comunicação, pesquisadores, protagonistas do sistema educativo (professores, alunos, funcionários do Ministério da Educação, pais). Precisa de uma atenção especial o fato que os professores encontram, portanto, além do contato necessário com os profissionais de comunicação, um lugar para poder medir e enriquecer a própria prática nos meios de comunicação.

Uma das atividades fundamentais do CLEMI é a formação de educadores do maternal ao ensino médio com competências nos setores de comunicação através de atividades com jornalistas, diretores de redação, técnicos, pesquisadores e universitários. São realizados workshops pedagógicos, visitas aos jornais, emissoras de televisão, rádios, congressos. Do ponto de vista de conteúdo são realizadas análises críticas das mensagens (análise de conteúdo, leitura das imagens); sobre a produção de instrumentos e de mensagens de informação (jornais, rádios, documentos); aspectos específicos da pedagogia dos meios de comunicação (noções fundamentais, noções disciplinares, vida escolar e formação do jovem nos direitos civis).

O CLEMI é também um banco de dados com trabalhos relacionados à informação, aos meios de comunicação e à escola na França e no exterior. São coletadas e conservadas as atividades pedagógicas, como relações de experiências (escritas ou filmadas), vídeo ou jornais informativos realizados em sala de aula. A coleção de jornais realizados em classe, por exemplo, ultrapassa os 65 mil exemplares e são mais de 10 mil títulos, alguns franceses e outros estrangeiros. O CLEMI se ocupa também em arquivar as pesquisas universitárias relacionadas aos meios de informação e à escola. Como forma de divulgar o trabalho desenvolvido são elaborados fascículos informativos sobre os meios de comunicação e os jovens, além de obras especializadas.

A atividade internacional do CLEMI na educação aos meios de comunicação recebe apoio de diversos organismos internacionais. A proposta é a participação ativa de todos os participantes e principalmente da capacidade de oferecer organicidade às iniciativas, como a criação dos Centres de Documentation et d’Information (CDI) nas escolas. Mas é importante colocar em relevância que apesar do caráter sistemático da proposta de uma política pública em educação aos meios de comunicação, o programa francês não chega para todas as escolas e o ensino da linguagem dos meios de comunicação não está presente em todos os currículos nem em todas as escolas. A trajetória do CLEMI mostra um verdadeiro interesse em fazer com que seja mais acessível a educação aos meios de comunicação.

A Carta Europeia para a Alfabetização aos Meios de Comunicação (The Charther for Media Literacy) é um documento que tem como objetivo aumentar a sensibilidade e a compreensão por parte do grande público para a relação entre a educação aos meios de comunicação e os próprios meios de informação e expressão. Na Carta é ressaltada a importância da educação às mídias no desenvolvimento de políticas educativas, culturais, políticas, sociais e econômicas e se defende o princípio segundo o qual cada cidadão europeu de qualquer idade deve ter a oportunidade, seja em ambiente escolar ou extraescolar, de desenvolver as competências e os conhecimentos necessários para aumentar o próprio prazer, a própria compreensão e a exploração do mundo das mídias.

A proposta principal dessa Carta, portanto, é fazer com que cada cidadão europeu seja uma pessoa alfabetizada para os meios de comunicação de forma a poder usar de forma eficaz as tecnologias relativas aos meios de comunicação para ter acesso, conservar, pesquisar, pegar ou compartilhar conteúdos com a finalidade de responder às necessidades e aos interesses dos indivíduos e das comunidades; propõem também ensinar a fazer escolhas conscientes de formas e conteúdos das mídias através de múltiplas fontes culturais e institucionais; compreender como e porque os conteúdos das mídias são produzidos; analisar de forma crítica as técnicas, as linguagens e os códigos usados pelas mídias e as mensagens que são veiculadas; usar os meios de comunicação de forma criativa com a finalidade de exprimir e comunicar ideias, informações e opiniões; identificar, evitar ou colocar em discussão os conteúdos das mídias e os serviços não requisitados, ofensivos ou danosos; e usar os meios de comunicação no exercício dos próprios direitos democráticos e de cidadania. Mas a pretensão da Carta requer uma escola europeia diferente da que encontramos atualmente.

De acordo com Jesús Martin Barbero, a escola e o sistema educacional devem assumir que a técnica comunicativa é atualmente parte constitutiva da estrutura cultural da nossa sociedade. O fator tecnologia e linguagem devem coexistir a procura do desenvolvimento de uma população alfabetizada também no uso dos meios de comunicação. Trata-se, portanto, de preparar escolas e educadores para o futuro, oferecendo, ou permitindo para outros oferecerem, ocasiões para ampliar a sua experiência. Referindo-se à proposta da Carta, elaborada pela EuroMedia Literacy, o primeiro passo é a contribuição ao desenvolvimento das habilidades críticas ao analisar e a avaliar os meios, ampliando as habilidades criativas no uso dos meios para a expressão, a comunicação e participação no debate público. O compromisso no nível europeu é apoiar ou participar na pesquisa para identificar e desenvolver a alfabetização aos meios de comunicação, avaliando a eficácia de uma pedagogia sustentável nesse campo. De um ponto de vista prático, a EuroMedia Literacy oferece um banco de dados das pessoas e das organizações na Europa que sustentam a ideia de alfabetização aos meios de comunicação. 

Entre os projetos, o Centre for the Study of Children, Youth and Media, do Institute of Education da Universidade de Londres, no Reino Unido, onde são organizados projetos de pesquisa e consultoria, organizando redes de pesquisadores e profissionais em Media Education. Ali são desenvolvidos projetos como o “Civicweb: Young People, the Internet and Civic Pariticipation”, dirigido por David Buckingham em parceria com a Universidad Autònoma de Barcelona, onde foi realizada parte da pesquisa desse livro.  Nesse projeto são abordadas questões cívicas e políticas da alfabetização dos jovens nos meios de comunicação, especificamente no uso da Internet. Potencialmente estes recursos constituem uma forma potente e não convencional de aprender que interessa ao desenvolvimento do capital social e da participação política, social e econômica. São três as dimensões desse fenômeno: a produção, incluindo as motivações; os procedimentos de trabalho e os modelos econômicos dos produtores. O projeto pretende medir a participação ativa entre os usuários nos usos e interpretações de diferentes grupos sociais de jovens e a relação entre essa atividade e o seu senso cívico de participação social. É nosso objetivo avaliar como esses procedimentos são variáveis entres as diversas culturas políticas na Europa e as suas influências nas relações entre as gerações. O Civicweb é um exemplo de projeto diretamente ligado à participação social e ao planejamento de uma educação para o desenvolvimento.

A experiência da escola com a Internet está ainda em desenvolvimento. A questão da segurança ainda predomina nos projetos mundiais, incluindo  a Comunidade Europeia, que financia o “Safer Internet”, com o objetivo de orientar uma navegação segura dos jovens na rede e o uso dessa tecnologia como recurso global. A tecnologia oferece uma oportunidade histórica que permite à escola sair do seu tradicional isolamento espacial e temporal. O conceito de escola passa por uma transformação, por um policentrismo formativo, como a prática da instrução à distância e a instrução permanente. A Internet permite o acesso a informações remotas que antes não eram acessíveis, como bancos de dados ou materiais e exemplos didáticos, comunicação, interação com outro sujeitos, cooperação entre sujeitos remotos e constituição de novas comunidades virtuais. A noção de interatividade favorece o acesso à informação.

O uso da Internet a qual essa noção pode ser aplicada deve ser, portanto, consciente. Em Portugal, por exemplo, o ministério da Educação elaborou o projeto “SeguraNet” com a universidade de Algarve para guiar os jovens, as escolas, os professores e os pais para um comportamento mais orientado e consciente diante da rede através do aprendizado do uso de instrumentos de pesquisa, uso do e-mail, chat, blog, redes sociais, etc, oferecendo sugestões de percurso. Na Inglaterra, o “Childnet International” é um projeto de consciência  sobre o potencial educativo e informativo da Internet  e de proteção aos riscos do uso inconsciente que tem a pretensão de atuar não somente dentro do país, mas divulgar também os seus serviços da Espanha, na França e Alemanha. Na Bélgica, a Universidade de Louvain La Neuve desenvolveu o “Educanet”, que desenvolveu um kit pedagógico para a educação à Internet que é usado como recurso didático nas escolas.

Na Alemanha, o “Safer Internet” está em atividade desde 2001 através do projeto “Sikfal” e sob a coordenação da “GermaniaGesellschaft für Medienpädagogik und Kommunikationskultur” (GMK), a associação para a Media education e cultura de comunicação da Alemanha. Fundada em 1984, a GMK é uma organização de apoio para diversos profissionais e estudiosos, apoiada tanto no trabalho prático quanto acadêmico nos campos de formação e de educação aos meios de comunicação. O GMK funciona como uma vasta plataforma para a discussão, a cooperação e as novas iniciativas no setor na Alemanha e o princípio do trabalho realizado por eles é a mediação da competência no uso dos meios de comunicação e a atuação como multiplicador da ideia da pedagogia das mídias. Isso inclui projetos especiais de formação dos educadores e dos alunos na escola maternal, escolas de ensino fundamental, mas também várias iniciativas fora da escola em todo o território alemão através de diversos “landesgruppe”. Posteriormente o GMK se dedicou também em assegurar a participação ativa de todos os grupos sociais na comunicação pública para satisfazer as exigências culturais e comunicativas de cada indivíduo. Na sua avaliação cada um deveria poder exprimir os seus interesses e experiências através dos meios de comunicação.

Especialistas no campo acadêmico, político e profissionais dos meios de comunicação permitem ao GMK participar diretamente dos processos de resolução política assim como dos discursos acadêmicos. Os casos de desigualdade social e educação para o desenvolvimento são tratados especificamente pelo programa “Medienbildung in der Migrationsgesellschaft – Beiträge zur medienpädagogischen Theorie und Praxis”, que contribui para a formação midiática principalmente entre os imigrantes e funciona em conjunto com o projeto “More colour in the Media! Gesellschaftliche Perspektiven für das Zusammenleben in Deutschland”, que promove a integração dos jovens imigrantes usando os instrumentos midiáticos como proposta de política pública.

A possibilidade de contar sobre si mesmo e sobre suas dificuldades através dos meios de comunicação é uma importante estratégia de integração que os países que recebem muitos imigrantes podem aplicar. Os meios de comunicação têm um papel muito importante tanto da parte negativa, no desenvolvimento de preconceitos, quanto positivamente, no estímulo à integração. Uma pesquisa realizada pelo Istituto degli Innocenti de Florença, na Itália, demonstrou que publicar notícias negativas relacionadas às crianças imigradas sem enfatizar que são casos isolados, por exemplo, reforça preconceitos e cria obstáculos para a integração. Na Europa, a exclusão social dos imigrantes é um dos desafios sociológicos mais importantes da atualidade e os meios de comunicação exercem forte influência nesse panorama.

Nos últimos anos aumentaram os estudos sobre dispersão escolar, exclusão e marginalidade, demonstrando o papel determinante da escola e da família. O projeto “MediaArteLab@School – Creative Media Competence with Hypermedia and Mixed Reality-Systems in the Framework os Aesthetic Research Project”, na Alemanha, coordenado programa de pesquisa “Hochschul – und Wissenschaftsprogramm (HWP) em cooperação com a Universidade de Flensburg e de Lübeck e a UNESCO Project School.

O “MediaArtLab@School” foi um dos percursores ao criar as estratégias criativas dos meios de comunicação em um contexto de formação baseado na percepção, uso e reflexão. Assim, no contexto escolar, foram inseridas formações para o uso de programas interativos nos computadores e a criação de histórias desenvolvidas com sistemas interativos como o “Tangibe Media”, que usava recursos do “Lego Mindstorms Robolab”e o “lego.com Educational Division Technik” (LPE). Foram realizadas atividades também como a criação de um ambiente interativo de jogo com o software de reconhecimento de imagens “MediaCommand” da Universidade de Lübeck e a integração do corpo físico no jogo; sistemas móveis para o estudo do espaço com “handheld devices” como o PDA e o GPS para mapeamento dos espaços.

Diversos projetos foram desenvolvidos também para aproximar os adultos da tecnologia, oferecendo cursos de formação para o uso de email, chats, forum, compras online e motores de busca. A ausência de conhecimento sobre o potencial da Internet é um outro elemento de exclusão. As novas relações sociais e midiáticas são intensificadas pela dinâmica da comunicação global, pelo fluxo ininterrupto de informações e em um modelo de educação relativamente simples e mecânico na sua relação com os meios de comunicação. Existe um paralelo entre a desigualdade na educação e na vida que não pode ser desprezado. E não é mais um fator de proteção contra os efeitos negativos da tecnologia na comunicação, como se pensava anteriormente, e sim uma aproximação consciente do poder que os meios de comunicação exercem.

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