A desigualdade aparece tanto na representação política quanto na individualidade e ter o domínio sobre essa percepção é um fator que permite notar quando ela é injusta ou quando é resultado de um processo “natural”, que dependa mais das escolhas individuais que das determinações da coletividade. O debate sobre a oportunidade é essencial para levar o problema para um âmbito mais amplo, considerando fatores econômicos, políticos e sociais.
Para Amartya Sen, a igualdade é ter oportunidades iguais. A igualdade justa é aquela que permite ter igual liberdade de conquistar condições de vida específicas. O juízo de igualdade deve ser fundamentado na avaliação se aquele indivíduo ou aquele grupo tem condições de desenvolver as capacidades necessárias para atingir, se desejamos, determinados resultados.
Essa concepção nos permite perceber profundamente como o processo educativo e também a participação democrática aos meios de comunicação são elementos essenciais nas políticas de aquisição de competências. Estabelecer uma sociedade de oportunidades iguais é fornecer amplamente as condições para desenvolver as capacidades individuais. Desenvolver competências e ampliar conhecimentos é o caminho para mudar um sistema social que não permite a todos ter as mesmas condições de desenvolvimento.
O poder de estabelecer a própria trajetória intelectual permite uma cidadania mais completa e global. Ampliar o percurso individual depende do desenvolvimento, segundo Michel de Certeau, de estratégias e táticas. Estratégia é o cálculo das relações de força disponíveis, a tática é levar em consideração as próprias necessidades. Aprender a desviar, rodear a racionalidade dos dispositivos presentes na sociedade.
A maior parte das ações do quotidiano, como ler, falar, dirigir, fazer compras são táticas, enquanto a estratégia é a concretização da cidadania, como a escolha da carreira, a dedicação ao trabalho, ter filhos. A inteligência é indissociável do combate e dos prazeres quotidianos que se articulam, onde as estratégias escondem a sua relação com o poder que os sustenta, no ambiente ou instituição ao qual é relacionado.
Pequenos sucessos, a arte de fazer (ou não fazer) são táticas que nós mesmos desenvolvemos quando decidimos viver com consciência. Essas performances dependem de saberes antigos que os gregos chamavam de métis mas, como nos lembra Certeau também as astúcias dos peixinhos ou das plantas são colocados em conexão com esses saberes sem memória. Na ausência de poder para ter uma linguagem própria para a apropriação do saber, o indivíduo se coloca à margem do processo comunicativo e se contenta em ser um consumidor.
A informação “socialmente necessária”, na terminologia adotada pela Unesco, depende de recuperar o valor político e didático dos meios de comunicação, que serão norteados pela consciência social, cultural e existencial do ser humano. As qualidades intelectuais dos indivíduos devem ser valorizadas e respeitadas, assim como seus valores, ideologias, expectativas, desejos não devem ser menosprezados. O empobrecimento social, a reduzida participação nas decisões, a valorização do individualismo são reflexos desse desrespeito coletivo.
O nosso mundo é complexo e complicado, a complexidade vem do crescimento exponencial de indivíduos, grupos, organizações que querem ser autônomos e ter a identidade preservada e a complicação é que existem muitas linguagens, tecnologias e formas de construir e destruir as relações sociais, normas e valores, participação e significados. Uma educação para o desenvolvimento é a que não desconsidera as iniciativas e percursos individuais ou de pequenas coletividades ao interno da sociedade, onde o capital, a concentração de renda e o domínio das informações prevalece como privilégio de poucos.