Projetos de educação à leitura da informação pelo mundo

Diante do avanço das novas tecnologias e preocupados com o futuro do jornalismo, em 1991 a World Association of Newspapers (WAN) elaborou o projeto “Young Reader Committee” com o objetivo de realizar uma troca global de informações e opiniões sobre o uso do jornalismo na educação. A WAN é uma organização fundada em 1948 e reúne associações nacionais de jornais abrangendo mais de 100 países, com foco no desenvolvimento da indústria jornalística e no contato entre proprietários de jornais para a cooperação no plano regional, nacional e internacional.

Desse projeto da WAN surgiu o programa “Newspaper in Education”, que organiza a cooperação internacional para fomentar o acesso às informações jornalísticas a partir da implementação e do desenvolvimento de atividades de educação à leitura nas escolas em todo o mundo. No fórum “World Young Reader Conference” a cada dois anos são debatidos os programas de incentivo à leitura em todo o mundo, a troca de experiências, os problemas e as soluções encontradas nas propostas de educação à informação, que promovem as habilidades de competência em leitura analítica e reflexão sobre o papel do jornal na sociedade democrática.

O jornalismo é promovido a um recurso adicional da escola para a competência de leitura. Através da educação à informação jornalística, os estudantes aprendem a ter acesso, analisar e avaliar os conteúdos, assim como reelaborar, usar como instrumento de reflexão e debate, tanto sobre o conteúdo como sobre a relação entre o processo de informação e uma maior consciência sobre a inserção pessoal na sociedade. O jornalismo é instrumento para favorecer a cidadania e servir como material adicional para as diversas disciplinas escolásticas, como a matemática, política, ciências, estudos sociais, geografia e pensamento crítico. Um dos objetivos da WAN é fazer com que a informação jornalística seja considerada parte de uma política pública de educação à leitura e que seja adicionado ao currículo escolástico.

Já no distante ano de 1795, o jornal “Portland (Maine) Eastern Herald”, dos Estados Unidos, publicou um artigo explicativo sobre a virtude do uso do jornal na escola para melhorar a leitura, ensinar geografia, ciências e práticas de comércio. O “New York Times” e o “Milwaukee Journal”, também americanos, foram os primeiros a criar um programa formal de educação à leitura dos jornais na década de 1930. Na Europa, foi na Suécia e Finlândia que se criou, na década de 1960, as primeiras associações de editores jornalísticos para promover o incentivo à leitura dos jornais nas escolas. Em 1970, a Noruega começou a aplicar a proposta, seguida pela Holanda, em 1975, e Alemanha, em 1979. Na França, no mesmo período, os jornais foram proibidos em sala de aula por questões ideológicas. Na Áustria o primeiro programa é de 1995 e, em 1998, diversos países africanos receberam incentivos para criar programas de estímulo à leitura dos jornais. Desde 2003 a empresa  norueguesa produtora de papel Norsk Skog patrocina programa de incentivo à leitura jornalística em todo o mundo. 

Uma pesquisa realizada pela WAN concluiu que os estudantes gostam de aprender a ler informações jornalísticas porque “se sentem orgulhosos em ter acesso a um meio que pertence ao mundo dos adultos” e se tornam mais capazes de escolher o que ler. As experiências mostram que os jovens aprendem a desenvolver a leitura, a escrita e as competências críticas e os professores ampliam suas habilidades com esse recurso, aumentando o contato com o mundo externo e as atualizações do saber, como questões sociais, descobertas científicas e novas tecnologias, diminuindo as distâncias entre a realidade do mundo e a realidade da escola. 

Vocabulário prático, modelo de texto mais claro, conciso e simples, possibilidade de continuidade da leitura por toda a vida, tudo isso influencia na motivação, atitudes e habilidades escolares e acadêmicas. A informação é fluida e relevante, oferece instrumentos para uma cidadania mais responsável socialmente. 

A WAN realiza concursos que indicam projetos mais inovadores na educação à leitura dos textos jornalísticos em sala de aula, o World Young Reader Prize. Em 2007 os vencedores foram o Youth Edition da Prensa Grafica, El Salvador; SchoolHouse News do Patriot News, USA; e o Campaign: Let’s save Rospuda da Gazeta Wyborcza, Polônia. Em 2006 venceu Times of India, da Índia; No Clowning Matter do Aprendo, Panamá; enlaCe de El Correo, Espanha; 757: Teens Cover the Code, do The Virginian-Pilot, USA. Em 2005, Science of Life do Limpopo Mirror Newspaper, da África do Sul; e Eureka do The Irish Independent,  da Irlanda. Em 2004, The Telegraph in Schools do Ananda Bazar Patrika, da Índia, e Passport to the World, do The West Australian, Austrália.  Em 2003, Families & the News do The Daytona Beach News- Journal, USA. Em 2002, Star In You do The Sunday Times, África do Sul. Em 2001, Mind Your Own Business! do The Western Mail and Echo Ltd, da Inglaterra. Em 2000, Aprendo do La Prensa, Panamá. Em 1999, ReadRight di The Sunday Times, África do Sul. Em 1998, El Diario de los Chicos de La Nueva Provincia, Argentina; e Childhood that Teaches de O Dia, Brasil. 

Um desses projetos vencedores do “World Young Reader Prize” foi o “Youth Edition”, produzido pela “Prensa Grafica”, de El Salvador, em 2007. O jornal publica uma edição toda voltada para os jovens, desde o desenho gráfico ao texto, a escolha das fotos e escolha dos assuntos a serem noticiados. O jornal fica mais “positivo” e as notícias ruins desaparecem das chamadas de primeira página. Nada de tragédias, violência, nas páginas do jornal predomina o otimismo pelo futuro. Aparece o debate político, os problemas sociais e as dificuldades econômicas, mas procurando ver o problema do ponto de vista das crianças e dos jovens. 

Em 2006 um dos projetos vencedores foi o “No Clowning Matter, Leo y Aprendo”, do jornal “La Prensa”, do Panamá. Um espetáculo circense mostrava às crianças como um jornal era produzido, desde a coleta das informações até mostrar como funcionava um tipógrafo. Marionetes, mágicas e música aproximam do universo infantil o mundo da produção e divulgação das informações. 

Já o projeto “enlaCe”, do jornal espanhol “El Correo”, convida leitores para escreverem em todas as seções, com exceção da política, dialogando com os textos “oficiais” dos jornalistas profissionais. São publicadas também fotos realizadas pelos leitores e a seção “Recordações”, em que uma vez por semana são propostas questões sobre tradições ou aspectos do lugar, onde os leitores podem comentar os erros cometidos pelo jornal e podem até criticar a escolha das informações noticiadas e sugerir mudanças. O uso da Internet é amplamente usado nesse projeto. O também premiado “757: Teens Cover the Code”, do jornal norteamericano “The Virginian Pilot”, é produzido por cerca de 90 adolescentes-repórters e o conteúdo é divulgado também em podcast e redes sociais. 

Em 2005, o projeto sul-africano “Science of Life”, do “Limpopo Mirror Newspaper”, venceu o prêmio por ter criado um suplemento semanal de ciências idealizado para melhorar a aprendizagem científica e as competências numéricas. Ciências também é o foco do premiado “Eureka”, do “The Irish Independent”, da Irlanda, uma revista de ciência para os alunos da escola primária que tem como objetivo estimular o interesse pelo assunto. A revista é distribuída em 720 escolas e tem 20 edições anuais. 

Já em 2004 o projeto premiado foi “The Telegraph in Schools”, do “Ananda Bazar Patrika”, da Índia, em que 600 estudantes entre 10 e 18 anos produziram um jornal semanal com orientação de profissionais de comunicação, envolvendo 278 escolas. No mesmo ano o projeto australiano “Passport to the world”, do “The West Australian”, envolveu mais de 5 mil estudantes na produção de suplementos de turismo e notícias gerais sobre diversos países. 

Em 2003, “Families & the News”, do “Daytona Beach News Journal”, dos Estados Unidos, venceu o prêmio porque desenvolveu um programa de educação à leitura dos jornais para crianças de baixa renda. As famílias inscritas no projeto recebiam uma assinatura do jornal em casa diariamente, com suplementos especiais para ajudar na leitura e compreensão das notícias. Participaram 24 escolas, 148 professores e 1.445 famílias.

O projeto “Star in You”, produzido pelo “Sunday Times”, da África do Sul, foi escolhido em 2002 por apresentar diversas iniciativas para desenvolver a inteligência emocional dos alunos, discutir problemas ambientais  e sociais, refletir sobre problemas na área da saúde, como a AIDS. O sucesso do projeto foi tanto que as iniciativas foram agregadas ao currículo escolar nacional sobre a orientação para a vida, tecnologia e ciências naturais. Foi desenvolvido um kit didático para as escolas que adotam o programa em sala de aula, os produtores organizam eventos e workshops sobre responsabilidade social, os problemas do campo e das periferias – que normalmente são marginalizados nos grandes jornais. Uma multinacional patrocinou a distribuição gratuita dos jornais em mais de 2 mil escolas do país.

Em 2001, o projeto “Mind your Own Business”, do “Group Western Mail and Echo Ltd.”, do Reino Unido, venceu o prêmio por estimular professores a criarem em sala de aula “pequenos negócios” usando os jornais como instrumento de trabalho didático de compreensão da economia, das informações e das questões sociais. Cada criança recebia um jornal e uma apostila sobre como abrir uma empresa. Os professores receberam um guia para ajudar as crianças a planejarem a sua empresa. Além de estímulo à leitura, o projeto ensina matemática, design e tecnologia para o planejamento e produção do produto escolhido como objeto da empresa.  “Mind your own  business” promove competências específicas para a cidadania, como comunicação, solução de problemas, matemática, aprendizado da linguagem, iniciativa, espírito de trabalho em grupo, habilidade para seguir instruções, capacidade de liderança e habilidade de gerenciamento. Em 2001, 1.758 estudantes de 53 escolas participaram do projeto. 

O Panamá venceu o prêmio em 2000 com o projeto “Aprendo”, produzido pelo jornal “La Prensa”, em que foi produzido um álbum com informações atualizadas sobre o país que passou a substituir livros escolares que não estavam atualizados. Por exemplo, em 1998 a divisão política do Panamá mudou quando o governo anexou três reservas indígenas que antes eram autônomas. Nenhum livro escolar em 2000 tinha essa informação porque o Instituto Nacional Geográfico do Panamá não tinha condições econômicas para atualizar o mapa do país. 

Em 1999 o prêmio foi para o projeto “ReadRight”, do “The Sunday Times”, da África do Sul, um suplemento educativo com histórias, exercícios, mapas e outras atividades que deveriam ser feitas consultando os jornais.

“El Diario de los Chicos”, do jornal “La Nueva Provincia”, da Argentina, venceu o concurso em 1998. É um jornal semanal para as crianças que oferece também suporte para as escolas e que atingiu 30 mil estudantes e 230 professores em 65 escolas. O programa estimula a escrita, mostrando aos professores  e estudantes a realidade de uma redação de jornal. No mesmo ano foi premiado o projeto brasileiro “A Infância que ensina”, do jornal O Dia. Repórteres do Rio de Janeiro trabalham em conjunto com programas sociais para crianças carentes em que são abordados temas como o comportamento mais responsável com a comunidade, a importância de eventos culturais, como evitar doenças e a criação de cursos em que adolescentes oferecem lições para outras crianças que têm dificuldade na escola. 

Um outro projeto brasileiro foi indicado pela associação mundial de jornais. O “Para o seu filho ler”, do jornal Zero Hora, do Rio Grande do Su. O jornal criou um sumário especial para crianças com o objetivo de facilitar a leitura do jornal, esse texto era publicado em um box ao lado das matérias publicadas.

Outros projetos premiados, como o “Let’s save Rospuda”, do “Gazeta Wyborcza”, da Polônia, em 2007, realizou uma campanha nacional para salvar o Vale Rospuda, uma rica reserva biológica que corria perigo por causa da construção de uma via expressa. Os estudantes foram convidados para escrever e fotografar e as matérias foram publicadas pelo jornal, que também ajudou os estudantes a realizar manifestações, concertos em prol da reserva e a criação de blogs para publicar notícias sobre o fato. A mobilização provocou o bloqueio da obra por parte do governo.

Na Nova Zelândia foi reconhecido o projeto “NIE Maori Focus Month”, do “Fairfax Media NIE”, um projeto de marketing para os jovens. São elaborados pequenos jornais para serem usados na escola para promover campanhas educativas e culturais. Na Namíbia mereceu destaque “Etameko”, do jornal “Republikein”, que criou um scrapbook para prestar um serviço público oferecendo atividades educativas para crianças e suas famílias nas áreas rurais. O programa beneficia o aprendizado da linguagem em um país onde os recursos educacionais são muito limitados. Em 2006 foi premiado também o projeto “Pre-election Germany Project”, do jornal “Neue Osnabrücker Zeitung”, da Alemanha, que estimulou a consciência política através da publicação de editoriais diários direcionados para os jovens leitores e a distribuição de suplementos especiais sobre as eleições nas escolas.

Em 2003 o jornal brasileiro “O Dia” foi escolhido também pelo projeto “Cidadania na Infância – As crianças pedem os seus direitos”, parte do programa “O Dia nas salas de aula”. Os estudantes foram convidados a escrever cartas para o então presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva e o jornal selecionou algumas que foram publicadas pelo jornal. Mais de 200 estudantes de 17 escolas descreveram as suas vidas e seus problemas e sugeriram soluções paras as suas dificuldades. As cartas foram divididas em quatro temas: trabalho, fome, violência e expectativas. 

Na Nova Zelândia, a partir do projeto “Go Zone”, do “Independent Newspaper”, também premiado em 2003, foi criado um Centro Nacional de Educação à Leitura dos Jornais. O que podemos concluir, diante de tantos exemplos, é que em todo o mundo foram criados e estimulados projetos de incentivo a um melhor aproveitamento das informações publicadas.

Na forma mais elementar, um programa de educação à informação em uma sociedade democrática depende inicialmente do acesso que as escolas, os professores e os estudantes têm a esse direito. O jornalismo precisa ser reconhecido como um instrumento ativo e respeitável no processo de educação na vida em comunidade. 

É essencial que as escolas e os meios de comunicação tenham  maiores possibilidades de diálogo e troca de informações. A associação mundial de jornais recomenda que sejam criados programas nacionais de acesso à informação, a criação de políticas públicas para o desenvolvimento de programas de educação à informação. Tanto a escola quantos os meios de comunicação são serviços públicos que podem e devem caminhar conjuntamente para identificar os problemas e propor estratégias de exercício da cidadania. 

É necessário um estímulo à produção de material didático que possa servir como guia para os professores que trabalham com a educação à informação. As atividades do jornal que podem ser combinadas com um projeto de educação à informação são: projetos de serviços comunitários, concurso de literatura ou artes, cursos de formação, uso das bibliotecas, visita de jornalistas às escolas, visitas guiadas às instalações dos meios de comunicação.

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