Propostas de uso do jornal na educação à informação

Para Santo Agostinho as palavras são eficazes para nos lembrar como vemos as coisas. A habilidade de encontrar as palavras certas, de saber conduzir uma narrativa ou seguir um discurso não é inata, deve ser desenvolvida na forma cognitiva, mas também com o desenvolvimento da criatividade e da capacidade de dar expressão ao pensamento. A comunicação caminha junto com a vida, mas é um espelho que deforma, incompleto. Todo relato implica em uma seleção dos fatos, detalhes são suprimidos, elementos são esquecidos e outros são adicionados.

Para uma boa comunicação é preciso conhecimento e competência. Renee Hobbs, ao estudar a alfabetização para os meios de comunicação,  demonstrou que para aprender a se comunicar bem o indivíduo deve antes saber fazer uma análise, argumentar, ser capaz de se expressar corretamente, deve possuir conceitos analíticos porque toda comunicação tem características únicas que dependem da capacidade de negociar significados. O uso do poder da palavra é parte da aquisição do conhecimento ao longo da vida.

Len Masterman identificou que a prática da educação aos meios de comunicação aumenta a capacidade de representação da realidade dentro do processo de construção de narrativas, de conseguir identificar no texto elementos para avaliar e ser capaz então de elaborar uma opinião. Aprende-se a compreender o conteúdo das mensagens, de investigar sobre as possibilidades do discurso, saber como o texto se organiza, contextualizar. A linguagem jornalística, os seus limites e suas potencialidades sobre o seu uso social é reconhecida como um saber análogo àquele da progressiva formalização dos processos educativos e da instrução. Esse saber teórico-prático, deveria, na era da informação,  ser considerado parte integrante da formação básica, não poderia mais se limitar aos aspectos técnicos e formais das novas tecnologias, seria, como adverte Chiara Salvatori, tentar explicar a revolução industrial limitando-se a ilustrar o funcionamento e as possíveis aplicações da máquina a vapor.

A educação aos meios de comunicação, ao ser discutida pelo Conselho Europeu a partir da criação do Council of Europe Resolution on Education in Media and New Technologies, oferece mais poder e liberdade de expressão para as crianças e jovens, preparando-os para atuar com mais força na construção da sua cidadania e aumentando a capacidade de participação política e social. 

O jornalismo, apesar das fortes transformações, não perdeu sua importância como uma das possibilidades de comunicação humana, especialmente entre os adultos. Mesmo para as pessoas com uma formação intelectual mais limitada o jornalismo continua sendo a fonte de diálogo com os acontecimentos exteriores à vida pessoal. É onde se busca saberes sobre a comunidade, o país, o mundo, é onde o saber continua a ser construído. 

A regularidade na leitura de um jornal, por exemplo, oferece conhecimentos novos, amplia o vocabulário e melhora a ortografia do leitor. Quem é mais informado se sente mais seguro para participar de debates com conhecimento do assunto, desde situações da atualidade, fatos históricos, projeções para o futuro e experimenta a satisfação pessoal de se sentir valorizado e respeitado pelos outros pelo seu conhecimento. A segurança no diálogo impressiona na vida social e no trabalho, assim o espírito de participação social é estimulado.

O uso do discurso jornalístico nas escolas como recurso pedagógico aproxima a escola do mundo. Analisar a representação de problemas, conflitos, contradições, soluções, mas também desenvolver a capacidade de criticar o que “eles” (o discurso do poder dos meios de comunicação) filtraram dos fatos e elaboraram como narrativa do real, fazer novas interpretações e abrir a estrada para a autonomia do pensamento crítico. Saber identificar as ideologias, as posições políticas e ideológicas, os medos, os preconceitos, as perplexidades.

A estrutura fragmentada, imediatista e simples, as generalizações, as dificuldades da linguagem, a opinião escondida, a suposta autossuficiência, a demonstração inexata da naturalidade dos fatos que na verdade são historicamente construídos.  

A leitura crítica do discurso jornalístico oferece ao leitor a capacidade de ser sujeito da leitura, de reconstruir e se aproximar dos fatos. A passagem entre a leitura fragmentada, na qual a percepção do vínculo entre os fatos é dificultada, para uma leitura mais articulada e além da exterioridade oferece ao leitor a capacidade de estabelecer conexões entre os fatos, nos seus significados e motivações mais ou menos visíveis, pede um processo de formação intencionalmente estruturado para oferecer habilidades específicas para o estudante enfrentar com sucesso o seu estado inicial de leitura para um outro, crítico, amplo, profundo e apaixonado. A exposição dos fatos no discurso jornalístico é sempre marcada por contradições, os conflitos são diluídos, os jogos de poder são ignorados, essas ausências dificultam a compreensão. Assim como a representação negativa de um inteiro segmento da população para um delito cometido por um indivíduo é uma forma linear de apresentar os fatos que não corresponde à realidade. O jornalismo tem a  prática de mostrar uma totalidade com um só exemplo, muitas vezes não correspondendo à realidade.

Um outro aspecto que o estudo do discurso jornalístico propõe é a dependência das informações das fontes oficiais, parlamentares, sindicais e ministeriais. Os discursos desses membros institucionais são muitas vezes publicados como notícia, apesar de muitas vezes camuflar somente articulações políticas. Além disso, a atenção oferecida, o destaque, a escolha das palavras, o tamanho da notícia, a decisão de divulgar ou não imagens junto com a notícia, tudo isso reflete opiniões dos meios de comunicação que um bom leitor/espectador deveria ser capaz de perceber e administrar. 

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