Desde a Grécia Antiga, educar é, além de aprender a ler e escrever, formar o caráter, a personalidade, desenvolver um modo de vida elegante, esportivo e mundano. Uma cultura aristocrática que não demonstra interesse pela igualdade entre as classe sociais. A partir do Humanismo será defendido o direito à educação, a convicção de que o homem pode evoluir independentemente da sua origem, de acordo com as suas possibilidades de se aproximar da informação. Existirão sempre obstáculos para os que nasceram fora das classes de poder, mas a educação seria a possibilidade de superar essas dificuldades.
A procura pela informação faz a diferença, frequentar uma biblioteca, ir ao teatro, ler jornal, todos esses atos têm um valor de saber embutido. O verbo informar deriva do latim e não significa somente fazer referência a fatos, mas também “formar a mente”. No século XV, em alguns ambientes políticos e científicos, a informação ganhou ainda mais valor e, no século XIX, na sociedade comercial e industrial, passou a ser essencial diante da transformação das ideias de velocidade e distância.
A alfabetização aumentou a mobilidade social, as classes sociais passaram a interagir nos processos de formação pessoal e o conceito de cidadania se afirmou. A contribuição da alfabetização à industrialização, ao “progresso” e a “civilização” significa uma aproximação mais racional e receptiva à vida. Os meios de comunicação facilitaram a acumulação dos conhecimentos, ampliando o acesso às descobertas, tornando mais difícil a perda das informações, os leitores podem ser mais conscientes da existência de versões e interpretações em conflito entre elas.
As percepções dessas “realidades” ou “verdades” diferentes em confronto, que os meios de comunicação ajudaram a desenvolver, não é, no entanto, um bem para todos. A incapacidade de compreender as complexidades produz desigualdade porque afasta do poder e das decisões comuns quem não tem essas competências, uma bagagem estruturada de conhecimentos.
O conhecimento é um bem fundamental e cada escolha na vida depende do que conhecemos e queremos. Se isso é negado, somos privados das nossas capacidades de decisão, do direito de sobreviver com dignidade. O direito à informação e ao saber não deveria ser limitado por nenhum fator e isso depende de como se aprende a construir significados e extrair novas informações da realidade. Uma mente plena de saberes, de competências, capaz de gerir os próprios processos de aprendizado, de perceber as complexidades, as diferenças, as tensões e regular tudo com uma capacidade reflexiva.
Os limites da comunicação do saber vêm dessa capacidade de gestão dos conhecimentos e de não ser atropelado pela abundância de informações. A compreensão depende da estrutura mental e de um ajuste entre a recepção dos dados e a configuração do saber. Para percorrer a estrada da aprendizagem valorizamos o conhecimento pessoal, o hábito de fazer perguntas, ultrapassar barreiras e estabelecer relações, de forma que o universo dos saberes não seja bloqueado, mas seja um caminho como sempre foi e sempre será, cada vez mais, no tempo atual.
O acúmulo constante e a reprodução do capital cultural e de interesses adquiridos faz com que a sociedade se desenvolva. Por esse motivo nas sociedades em desenvolvimento existem mais dificuldades de condição de transmissão do saber, existe maiores obstáculos para encontrar caminhos que liguem a tradição à inovação, ao crescimento econômico e desenvolvimento social, com consequente redução de situações de desigualdade. É um percurso individual que apenas com o suporte da coletividade se integra à sociedade. A aquisição do saber não depende apenas da possibilidade de ter acesso a grandes quantidades de informações, mas também da inteligência, dos pressupostos e das práticas individuais.
A pobreza está sempre em conflito com o desejo intelectual porque cria obstáculos para o acesso ao conhecimento. Os problemas na comunicação são mais intensos em uma sociedade mais desigual e, como observa Sócrates no Gorgia, o poder é o poder da palavra. Na redução da concentração do poder, a comunicação pode ser um instrumento para o desenvolvimento sustentável, oferecendo a facilidade no acesso às informações, aos direitos e aos deveres. A potência da linguagem é advertida de forma socialmente agressiva em situações extremas como na pobreza africana.
Frantz Fanon mostra que um homem isolado tem mais dificuldade de compreensão de um problema que o grupo, que consegue visualizar soluções com maior rapidez. O recurso a um linguajar difícil, técnico, seria uma forma de dissimular o desejo e a intenção de domínio. Pode-se explicar tudo a todos, desde que realmente exista o interesse de que as pessoas compreendam o que está sendo dito. As incompreensões são a base da desigualdade. Por isso a comunicação se tornou cada vez mais exclamativa, violenta, impaciente. Um grito.
O poder da palavra e dos seu usos, de dar significado às coisas, é um bem adquirido no desenvolvimento das competências. São palavras ao vento na tentativa de se comunicar. O papel da escritura e da leitura no desenvolvimento das sociedades é tão importante quanto as transformações econômicas e políticas. O domínio da linguagem é o primeiro passo para procurar um lugar na vida social e a escola e os meios de comunicação são os principais fornecedores de saber.
O ato de ler é um posicionamento social e cultural ao determinar uma relação entre os outros e o saber. Por isso é imprescindível considerar que a palavra “ler”, que no latim tem como primeiro significado “coletar”, “colecionar”, em um segundo momento quer dizer “através”, “abrir caminho”. A etimologia sugere que o processo de leitura consiste em coletar sinais movendo-se sobre a superfície da escritura. O leitor como viajante em um espaço simbólico. Imagem adaptada a todas as tecnologias da escritura, especialmente apropriada à nossa cultura de construção de escrituras eletrônicas.
A leitura de um texto é um ato político e social somente se o leitor é capaz de “navegar” entre as informações de forma correta, nesse sentido abrir uma estrada onde possa caminhar com segurança. Os livros são as principais companhias nessa viagem, mas com a imprensa os jornais assumiram um papel até mais relevante, a nossa era da Internet ofereceu a oportunidade da resposta imediata. Um texto pode ser lido em vários níveis: linguístico, histórico, expressivo, formal, de conteúdo. Esses níveis podem ser jogados de forma dialética um contra o outro, delineando uma complexidade do texto, que pode ser comparado, podem ser construídas relações e referências com outros textos, passar por processos de formalização ou contextos históricos.
O processo eletrônico de contato com a palavra é fragmentário e pede um novo paradigma de compreensão textual. Diante dessa mudança de cenário, existem processos de dificuldade de socialização e formas inéditas de desigualdade, oportunidades em formas criativas e democráticas de aprendizado e de socialização, é o caso de repensar na educação em um contexto de mudanças constantes e processos de metamorfoses dos novos meios de comunicar para trabalhar pela melhor distribuição do saber no mundo.